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Novas diretivas da União Europeia sobre lavagem de dinheiro entram em vigor

publicado em 27/11/2018 09:25

27 de novembro de 2018

No último dia 12, entraram em vigor as diretivas 2018/1672 e 2018/1673 do Parlamento Europeu e do Conselho, no âmbito da União Europeia(“UE”). Ambas conjugam esforços no combate à lavagem de dinheiro dentro e fora da UE e podem ser entendidas como uma tentativa de uniformização dos controles pelos países membros, o que inclui a adoção de recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI).

A primeira delas (2018/1672), que deverá ser implementada pelos Estados-Membros até 3 de junho de 2021, objetiva aperfeiçoar o controle de entrada e saída de ativos denominados “dinheiro líquido”, através da obrigação de declaração destes valores.

Entram na definição de dinheiro líquido a moeda, os meios de pagamento ao portador (cheques, por exemplo), produtos utilizados como reservas de valor de elevada liquidez (joias e pedras preciosas, por exemplo) e cartões pré-pagos. Contrariando expectativas, não foram incluídos nesse rol moedas virtuais (bitcoins) em “cold storage”. A soma desses valores, se superior a 10.000,00 euros deverá ser declarada e dados pessoais deverão ser fornecidos.

Já a segunda (2018/1673), que deverá ser implementada até 3 de dezembro de 2020, objetiva uniformizar o combate à lavagem de dinheiro através da utilização de mecanismos próprios do direito penal. O entendimento predominante era o de que a legislação anterior no âmbito da UE tinha problemas de coerência e abrangência. Assim, haveria de ser criada uma definição do crime de lavagem uniforme para todos os estados-membros e mecanismos de auxílio entre eles no instituto de investigar e punir delitos de lavagem.

Ao contrário da primeira diretiva, esta aborda diretamente o tema das bitcoins para dispor que os riscos deste novo mercado deverão ser considerados nas legislações e políticas internas dos Estados-Membros, sem trazer, contudo, regulação mais precisa.

Os temas centrais da nova diretiva serão trazidos a seguir, juntamente com comparações com o tratamento dado ao delito de lavagem pela legislação e jurisprudência brasileiras.

1) O rol de crimes antecedentes para a caracterização do delito de lavagem. Os Estados-Membros da UE deverão considerar como crimes antecedentes todas as infrações, cometidas por autores ou partícipes, puníveis com pena de prisão de duração máxima superior a um ano oupuníveis com medida de segurança ou prisão de duração mínima superior a seis meses.

A diretiva também traz um rol de crimes que obrigatoriamente deverão ser considerados antecedentes, quais sejam: i) participação em grupo criminoso organizado e em ações ilegítimas para obtenção de fundos, ii) terrorismo, iii) tráfico de pessoal, iv) exploração sexual, v) tráfico de drogas, vi) tráfico de armas, vii) tráfico de bens roubados, viii) corrupção, ix) fraude, x)contrafação de moeda, xi) contrafação e pirataria de produtos, xii) criminalidade ambiental, xiii) homicídio e ofensas corporais graves, xiv) sequestro, roubo ou furto, xv) contrabando, xvi) crimes fiscais relativos aos impostos diretos e indiretos, xvii) extorsão, xviii) falsificação, xix) pirataria, xx) abuso de informação privilegiada e manipulação de mercado, xxi) cibercriminalidade.

Hoje, no Brasil, qualquer crime ou contravenção penal pode ser considerado delito antecedente para a caracterização do crime de lavagem. Assim, ainda que bastante abrangente, as regras da UE são mais restritivas que as nossas. Se aplicássemos os requisitos elencados pela nova diretiva na realidade brasileira, grande maioria das contravenções penais e crimes considerados de menor potencial ofensivo ficariam de fora desse rol.

2) As sanções. De acordo com a nova diretiva, o crime de lavagem deve ser punido com pena máxima não inferior a 4 anos. A partir disso, é responsabilidade dos Estados-Membros a criação de sanções ou medidas adicionais, como multas e proibição de licitação ou acesso a financiamento público.

Há, ainda, a recomendação de estabelecimento de sanções mais severas para titulares de cargos públicos pelos países e a previsão de congelamento e perda de instrumentos e produtos de crime, no mínimo nos casos previstos na Diretiva 2014/42 (corrupção ativa e passiva, organização criminosa, exploração de menores e pornografia infantil, interferência ilegal em sistemas). No que toca a esta última previsão, na legislação brasileira há previsão de perdimento de instrumentos e produtos do crime bem mais ampla: aqui não importa o tipo penal violado. No Código Penal brasileiro o perdimento de bens está listado como uma das consequências da condenação, enquanto que em nossa Lei de Lavagem este é entendimento como uma medida patrimonial de natureza processual.

3) As circunstâncias agravantes. A nova norma diferencia entre agravantes que deverão ser adotadas obrigatoriamente nos ordenamentos internos, e outras facultativas. Dispõe como agravantes obrigatórias: i) cometimento do delito de lavagem no contexto de organização criminosa ou ii) ser o infrator uma instituição de crédito, uma instituição financeira ou pessoas físicas ou jurídicas obrigadas pelo artigo 2. o da Diretiva (UE) 2015/849. No segundo item, a infração deverá ter sido cometida no exercício da profissão. Por outro lado, a diretiva estabelece como mera recomendação: iii) objeto da lavagem for de valor considerável ou iv) crime antecedente especialmente reprovável (participação em grupo criminoso organizado, terrorismo, tráfico de pessoas, exploração sexual, tráfico de drogas e corrupção).

No caso brasileiro, a pena prevista para lavagem de dinheiro é de 3 a 10 anos de reclusão, limite máximo bem acima do mínimo de 4 anos recomendado pela diretiva. Há previsão de causa de aumento, de um a dois terços da pena, a ser determinada pelo juiz do caso, se os crimes de lavagem forem cometidos por intermédio de organização criminosa ou de forma reiterada. Como se pode perceber, apenas a primeira modalidade é contemplada pela diretiva europeia.

A diretiva também expressa que o autolavagem de bens deve ser punível, desde que não se trate de mera posse ou utilização desses bens. No Brasil, não há lei expressa a esse respeito. A admissibilidade da responsabilização por autolavagem é uma construção jurisprudencial, consolidada quando do julgamento da Ação Penal 470 (conhecida como Mensalão).

4) Previsão da possibilidade de responsabilização de pessoas jurídicas pelo crime de lavagem, com critérios restritivos, algo sem previsão legal no Brasil. Neste caso, as infrações devem ser cometidas por pessoas que ocupem cargo de direção em alguma destas circunstâncias: a) poder para representar a pessoa jurídicas, b) autoridade para tomar decisões em nome da pessoa jurídica, c) autoridade para exercer o controle a nível da pessoa jurídica.

Também foram elencadas sanções específicas para pessoas jurídicas, como multas, exclusão de direito a subsídios públicos, interdição temporária ou definitiva da atividade empresarial, colocação sob vigilância judicial, etc. Caso o Brasil venha a adotar no futuro a reponsabilidade penal da pessoa jurídica para outros crimes que não só os da Lei de Crimes Ambientais, a nova diretiva pode vir a servir de parâmetro. 

5) Critérios de condenação. O mais ressaltado é a possibilidade de condenação por lavagem sem que tenha sido determinado com previsão o crime antecedente ou que tenha havido condenação por este delito. Tampouco importa o local de cometimento do crime antecedente. Além disso, a diretiva admite a possibilidade de existência de crime culposo de lavagem.

Estas disposições estão parcialmente alinhadas com o ordenamento e jurisprudência brasileiros. Os nossos Tribunais Superiores entendem que o crime de lavagem é autônomo em relação ao crime antecedente, ou seja, não é necessária prova cabal deste, mas tão somente indícios de que tenha sido cometido. Entretanto, não há previsão legislativa sobre a modalidade culposa do crime de lavagem, e a jurisprudência sobre a sua possibilidade não é homogênea. Apesar disso, figuras que se aproximam da figura culposa, como o dolo eventual e a cegueira deliberada, estão sendo aceitos por nossos tribunais.

A partir de agora, os países membros da UE terão que adaptar suas legislações internas para torná-las compatíveis com a nova diretiva. Deste modo, empresas que tiverem filiais dentro da UE deverão observar possíveis vindouras transformações legislativas. Já para aqueles atuantes somente em território nacional, as novas diretivas não perdem valor, já que, para evitar sanções em matéria de comércio e finanças internacionais, é estratégico que o Brasil siga padrões europeus.

É possível ler a promulgação dessas novas regras, como uma tentativa de maior combate e prevenção ao delito de lavagem no mundo. Vale lembrar que recentemente o Reino Unido também alterou sua legislação, de forma a dificultar a lavagem em territórios seus conhecidos como paraísos fiscais. 

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